Ele foi um dos mais célebres repórteres de campo em transmissões esportivas, feitas ao vivo direto dos estádios, principalmente geradas pelo rádio no Rio Grande do Sul. Mas foi muito mais que isso. O gaúcho de Itaqui João Carlos Calvano Belmonte foi também apresentador e comentarista, atuando também na televisão e jornais. Com uma carreira mais de quatro décadas de experiência, Belmonte (nome de guerra e artístico) foi vencedor diversas vezes de prêmios importantes como o Bola de Ouro, concedido em nível nacional, e o Prêmio ARI de Jornalismo (o maior do Rio Grande do Sul). Agora o Belmonte (ou Belinho, para os íntimos) está lançando um livro de suas memórias.
A obra
A ordem das narrativas não segue uma linha cronológica. Foram editadas em sequência, conforme os acontecimentos vieram à tona na tempestade de recordações desencadeada na memória de Belmonte, a partir do estímulo de escrever as reminiscências de uma trajetória pessoal que se mistura às histórias do rádio e o futebol no Rio Grande do Sul, desde a segunda metade do século XX. Algumas imagens que ilustram a obra vieram de arquivo pessoal do cronista, outras foram resgatadas durante a produção do livro, junto aos veículos de comunicação e colaboradores.
O livro inclui dezenas de fotos históricas inéditas, do arquivo pessoal do cronista e obtidas por meio de pesquisa em jornais de Porto Alegre e outros Estados, como é o caso do flagrante de Belmonte a um Leivinha lesionado, publicado em São Paulo com os créditos para o renomado fotógrafo Reginaldo Manente, vencedor de vários prêmios Esso. Apenas uma de tantas histórias que ele conta em detalhes.
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Imagem do Twitter da Rádio Guaíba |
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Foto Caco Belmonte |
E comemora uma felicidade em família: "foi a primeira vez em que os três, dois irmãos e o pai, trabalharam juntos. Roberto foi colega do pai na Rádio Gaúcha, anos 90. Quando fui redator na Guaíba, virada do milênio, o pai estava comentarista na rádio. Com o Roberto eu nunca havia trabalhado, salvo um único trabalho rápido como repórter para uma revista especializada em agronegócio e implementos agrícolas que ele editou por alguns anos (fiz uma matéria apenas). Então, na prática, é a primeira parceria oficial de trabalho entre pai e filho. Acabei eu, o “inventor” do livro, trazendo os dois para a minha área de atuação hoje em dia, que é a literatura e o mercado editorial", complementa Caco.
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Reprodução |
Para quem compra direto com o Caco Belmonte (cacobelmonte@gmail.com) e mora em Porto Alegre, existem dois pontos de entrega, caso a pessoa possa se deslocar. Um deles no bairro Cristal: podem retirar a qualquer hora, os envelopes com os nomes dos compradores ficam à disposição. O outro ponto é no Menino Deus (neste caso, precisa agendar dia e hora). A partir desta terça-feira (13/04), haverá livros à disposição na Letras e Cia (Av. Wenceslau Escobar 1823), Shopping Paseo.
Dona Lígia
A esposa e mãe dos "guris" esteve sempre ao lado do cronista, há mais de 50 anos. No início de abril, porém, uma triste notícia. Dona Lígia, já adoentada, faleceu em Porto Alegre, sem que o casal pudesse ter completado seus 54 anos de casamento. Ela foi a primeira a sugerir, logo após a aposentadoria de Belmonte, que ele pensasse em fazer um livro de memórias. Levou mais de dez anos para sair a obra. "Mas ela não apenas viu pronto, mas vibrou e chegou a constatar, antes de falecer, que o livro 'deu certo', conforme ela mesmo previra", conta o filho Caco. "Apesar do hiato e da perda irreparável, estamos tentando fazer o que ela dizia desde sempre, mesmo antes da doença: 'não parem nada por minha causa'."
Ao final da conversa que tivemos com o Caco Belmonte, perguntamos se agora era hora de ficar na capital e certamente não tão cedo voltar ao litoral. Ao que ele respondeu: "Ao contrário. Assim que pudermos, iremos ao litoral para espargir no oceano Atlântico as cinzas que restaram da cremação (desejo dela, desde sempre, muito anterior à doença: “me joguem no mar e nas plantas, em alguma mata nativa”)".
História de Belmonte (retirado do projeto Vozes do Rádio, Famecos, PUC)
Em Itaqui (RS), no dia 30 de maio de 1943, em plena Segunda Guerra Mundial, nasceu João Carlos Calvano Belmonte. Por volta dos dez anos de idade, em 1953, uma ano antes da Copa do Mundo na Suíça, o menino João Carlos mudou-se para a cidade de Uruguaiana. Já naquela época, o rádio era um grande companheiro. Os ouvidos estavam sempre atentos às emissoras cariocas, paulistas e gaúchas. Gostava de acompanhá-las sempre, de preferência, ao mesmo tempo. Belmonte interessou-se por fazer rádio ainda na escola, quando estudava no Colégio Marista. Nos campeonatos de futebol de botão que participava junto aos amigos, sempre fazia a transmissão dos resultados, mas através do telefone. Os meninos se telefonavam e trocavam informações sobre o andamento dos jogos. A intimidade com a linguagem esportiva e a vontade de transmitir uma partida já faziam-se presentes.
A primeira vez, sempre é inesquecível. E a primeira vez que Belmonte entrou em um estúdio não poderia ser diferente. Ao acompanhar um amigo a uma rádio local, a São Miguel, surgiu a primeira participação em um programa. Um dos locutores da emissora não havia aparecido, e Belmonte foi escalado para ler as notícias de esporte.
Mas Belmonte não sabia que sua voz estava sendo transmitida. Acreditou estar realizando um teste. Muitas pessoas vieram até os estúdios da São Miguel para conhecer o novo locutor. Depois do sucesso, a contratação era uma questão de tempo.
A estreia de Belmonte foi na rádio escuta. Mas na primeira oportunidade, virou apresentador do noticiário esportivo. Foi a partir daí que a carreira radiofônica do rapaz de Itaqui teve início.
A chegada em Porto Alegre foi atípica. Um dos repórteres esportivos da rádio, Fernando Martins, acreditava que Belmonte tinha condições de trabalhar em qualquer emissora da Capital. Martins tinha um amigo que trabalhava na Guaíba chamado Amir Domingues. Mas Belmonte não via motivo para se preocupar:
Porém, surgiu uma crise na emissora e alguns funcionários pediram demissão, inclusive Degrazia, que havia conseguido o emprego para Belmonte. Ele, em solidariedade ao amigo, pediu demissão também. Desempregado, não havia mais outro caminho senão o que levava a Porto Alegre..
Ao chegar na Capital, no ano de 1964, procurou Domingues na Guaíba. Mas ao chegar lá, ficou desencorajado. Foi, então, bater às portas da Rádio Difusora, hoje, Radio Bandeirantes. Disse quem era, e pediu um teste. Conseguiu o emprego. Meses depois foi convidado a trabalhar na Rádio Guaíba. Um semestre mais tarde, retornou à Difusora, em outra posição e ganhando mais.
A estrela de Belmonte brilhava sempre mais forte do que ele imaginava. E em março de 1966, Ari dos Santos, chefe da equipe esportiva da Rádio Gaúcha, contratou o rapaz de Itaqui.
Naquele ano fez a cobertura do que chamou “loucura da seleção”. Para acompanhar a seleção brasileira, viajava de kombi com outros jornalistas, pelo interior do Rio de Janeiro e São Paulo. Na época, os equipamentos eram verdadeiros “trambolhos”. Logo após esta viagem, o falecido Mendes Ribeiro veio com a notícia mais esperada para Belmonte:
– Prepara teu passaporte porque nós vamos embarcar para Londres, para fazer a cobertura da Copa.
Mas uma mudança no corpo de funcionários da Gaúcha impediu que Belmonte viajasse.
O convite para fazer parte do quadro funcional de esportes da Rádio Gaúcha veio num almoço, num sábado. Foi uma surpresa. Surpresa maior ainda foi quando descobriu, no mesmo dia, no restaurante, que o diretor da Guaíba queria falar-lhe sobre a possibilidade de uma contratação. No outro dia, após o trabalho, foi até a Rádio Guaíba. O convite era para substituir Lauro Quadros na reportagem esportiva, já que Quadros seria transformado em comentarista. Sugeriu o salário (claro que pediu muito mais do que ganhava) e esperou a emissora dar uma resposta. Ligou para a mulher relatando a loucura de pedir um salário três vezes mais alto, mas teria que manter a proposta, que foi aceita. No outro dia, foi contratado.
Mas tinha que pedir demissão na Rádio Gaúcha. Qual não foi a surpresa, o diretor de esportes da Gaúcha não quis aceitar sua demissão, e propôs um salário maior do que seria pago na concorrente. Mas Belmonte já havia dado sua palavra, e saiu da Gaúcha em 1968.
Cobriu muitas Copas do Mundo, campeonatos internacionais e brasileiros, inclusive a Libertadores da América em que o Grêmio venceu. Logo após, seguiu para Tóquio para cobrir a decisão do Mundial, quando o Grêmio trouxe a taça de campeão, em 1983.
Em 84, quando retornou à emissora, acontecia o auge da crise na Caldas Júnior.
A crise da empresa Caldas Júnior deu-se devido a um mau negócio. A empresa resolveu investir no canal de televisão. Houve compra de equipamentos muito caros, em dólares. Um problema no câmbio e a dívida aumentou. O salário dos funcionários não era pago no final do mês. Foi aí que surgiu o convite da RBS.
Durante toda sua carreira de repórter esportivo, Belmonte viajou muito. Conheceu muitos países e cobriu os mais importantes eventos esportivos mundiais. Relembra, como a mais significativa, a Copa do México, em 1970, pois foi a primeira a ser transmitida via satélite para o Brasil por emissoras de rádio, e a primeira a ser transmitida a cores. Para ele, a seleção nunca foi tão extraordinária como nos jogos de 1970. Outro motivo, foi o recebimento do Prêmio ARI de jornalismo, quando retornou do mundial.
Ao longo da vida jornalística de Belmonte, foram cinco prêmios levados para casa. Dois Prêmios ARI, quatro vezes ganhador do Bola de Ouro e inúmeros troféus. Em um determinado momento da carreira, Belmonte viu que era preciso dar espaço para as outras pessoas, outros repórteres esportivos. Já havia viajado pelo globo inteiro, feito coberturas de Copas do Mundo. Resolveu, então, virar comentarista.
Quando surgiu a vaga para comentarista, o repórter mais assediado pelas emissoras de rádio, não deixou escapar.
Em novembro de 1986, retornou à Rádio Guaíba, agora como comentarista. Em 1987, foi convidado para ser o mediador do programa Sala de Redação, pela RBS. Ficou na RBS por 15 anos. Em 1988, durante uma crise na emissora, foi demitido, junto com outros 300 funcionários. Imediatamente, retornou à Guaíba. Primeiro na televisão, e depois, na rádio.
Trabalhou também como repórter esportivo no Correio e depois como colunista. A coluna era chamada Agenda. A família sempre esteve presente na vida de Belmonte. Seu filho, Roberto Villar, quando pequeno, acompanhava o pai no Correio do Povo, quando ele ia, aos sábados, na redação do jornal.
Belmonte não tem ídolos, mas admira muito Ênio Andrade, Rubens Minelli, Zagallo, Falcão e Pelé, pela contribuição que todos deram ao esporte.
Artigo organizado por Renato Martins, editor da Rede #AtitudePositiva
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