Sabrina Cabral Souza, 26 anos, mora no Ceará e é formada em engenharia civil pela Universidade Federal do Ceará. Atualmente, a jovem lidera duas iniciativas para execução de projetos que unem temas sobre justiça social, ambiental e climática, buscando solução de problemas que afetam o Nordeste. Mesmo com o envolvimento nas causas sociais e ambientais, Sabrina pondera sobre as dificuldades enfrentadas pelos jovens para conseguirem oportunidades nas áreas de empregos verdes no Brasil.
Mattheus, 27 anos/Arquivo pessoal |
“Ainda há dificuldades para a juventude atuar, sobretudo aquelas de comunidades mais expostas ao impacto do clima. A maioria das oportunidades é de alta qualificação e está ociosa por falta de profissionais, o que leva as empresas a buscá-los fora do país. Além disso, as políticas públicas para inclusão produtiva desses jovens ainda caminham timidamente, faltando divulgação e diálogo ativo com o público sobre as ações desenvolvidas”, afirma.
O desabafo de Sabrina é respaldado por um estudo inédito do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef ) sobre a presença de jovens em empregos verdes e que destaca a urgência de qualificação profissional. Segundo o levantamento, dois milhões de jovens de 14 a 29 anos atuam em empregos verdes no Brasil, o equivalente a 30% de todos os brasileiros que trabalham nesse setor. No total, o Relatório Empregos Verdes para Adolescentes e Jovens e Habilidades no Brasil identificou 6,8 milhões de ofícios verdes em todo o território nacional, o que correspondem a quase nove de cada 100 vínculos empregatícios registrados no país.
As soft skills são um conjunto de competências importantes em todas as áreas, incluindo nos cargos verdes. Outrossim, para se destacar nesses ofícios, é necessário ter um conjunto de habilidades verdes, que incluem um pensamento crítico sobre o mundo atual, além de um olhar empático com todos aqueles que sofrem os impactos negativos das crises climáticas”
Gustavo Heidrich, Oficial de educação do Unicef/Arquivo Pessoal |
Gustavo Heidrich, oficial de educação do Unicef no Brasil, 41 anos, confirma que há empregos prioritários com grande potencial de geração de oportunidades para jovens. Entre eles, estão em setores de energias renováveis, arquitetura, engenharias sustentáveis, transporte, logística de baixo carbono, gestão de resíduos, reciclagem, saneamento, agricultura sustentável, produção florestal, serviços ambientais diversos, além da indústria de bens e consumo.
Segundo o documento, em termos percentuais, existem estados com uma proporção maior de empregos verdes ocupados por adolescentes e jovens, em relação ao total de empregos verdes, são eles Goiás (35,3%), Paraíba (35,2%), Alagoas (35,0%), Rondônia (34,5%), Mato Grosso do Sul (33,9%) e Ceará (33,7%). A diferença entre o maior percentual (Goiás, 35,3%) e o menor (Rio de Janeiro, 20,4%) é de cerca de 15% . E sugere que, em alguns estados, especialmente os com menor concentração de empregos verdes, a participação juvenil pode estar ligada a fatores estruturais persistentes no mercado de trabalho, como menor diversificação econômica ou alto índice de informalidade. Por outro lado, nos estados com maior participação de jovens nesses empregos, o resultado pode refletir a presença de políticas públicas ou iniciativas locais voltadas à promoção de economias mais verdes e à formação técnica da juventude.
Impactos
De acordo com a análise, os empregos verdes oferecem oportunidade concreta para que governos e empresas acelerem a transição ecológica, promovam o desenvolvimento socioeconômico e criem oportunidades de inclusão ao investir na formação de profissionais para o setor sustentável. Apesar dos avanços, a pesquisa alerta que os esforços para incluir habilidades verdes na educação profissional ainda são limitados e concentrados em regiões específicas, principalmente nos grandes centros urbanos, o que deixa muitos adolescentes e jovens sem acesso ao conhecimento necessário para conquistar oportunidades nesse mercado.
O estudo também alerta que, com as crises climáticas, o mundo reflete impactos devastadores, incluindo o aumento da temperatura média global, a elevação do nível do mar e a perda de biodiversidade. Para evitar piores implicações, é necessário que as emissões de gases do efeito estufa cheguem a 0% até 2050. Diante disso, a população precisará passar por uma transição profunda nos meios de produção, consumo, transporte e, consequentemente, nas relações de trabalho.
A pesquisa do Unicef destaca que, para reduzir impactos das atividades econômicas, melhorar a eficiência energética, aprimorar o uso de recursos e criar um ambiente de trabalho seguro e inclusivo para todos os trabalhadores, os serviços, segundo recomendação do Unicef, precisam ser realizados por trabalhadores qualificados que entendam de sustentabilidade, mudanças climáticas e ecologia. Sendo assim, os futuros empregadores buscarão novas habilidades e competências.
De acordo com o relatório, as gerações atuais e futuras se encontrarão em um ambiente de trabalho totalmente mudado. Com a transição para um mundo que tenha zerado as emissões, os jovens deverão estar equipados com os conhecimentos, as competências e os recursos essenciais para que, assim, possam ganhar a vida em uma nova economia. Essa transformação é uma chance de promover um desenvolvimento mais equitativo, evitando os modelos exploratórios e destrutivos de produção que caracterizam a economia atual.
Saberes sustentáveis
O Relatório empregos verdes para adolescentes e jovens e habilidade no Brasil, divulgado pelo Unicef, também destaca que, em um país com altos níveis de informalidade como o Brasil, é essencial que a educação para os empregos verdes ofereça treinamentos não formais e valorize as competências adquiridas na prática ou desenvolvidas em comunidades tradicionais. Os saberes e as experiências de povos indígenas e de comunidades locais podem ser aliados importantes na formação de uma juventude preparada para atuar de forma sustentável e inclusiva no mercado de trabalho.
O oficial de educação do Unicef no Brasil Gustavo Heidrich analisa que, para que os jovens se destaquem em qualquer área no mundo do trabalho, é necessário ter habilidades socioemocionais. No entanto, para se diferenciar nos empregos verdes, é importante ter inteligências críticas e uma visão de mundo realista. Além disso, os envolvidos devem se mover em prol da empatia, ter força de vontade para solucionar problemas e possuir saberes sustentáveis.
“As soft skills são um conjunto de competências importantes em todas as áreas, incluindo nos cargos verdes. Outrossim, para se destacar nesses ofícios, é necessário ter um conjunto de habilidades verdes, que incluem um pensamento crítico sobre o mundo atual, além de um olhar empático com todos aqueles que sofrem os impactos negativos das crises climáticas”, assegura Gustavo.
Apesar da relevância do tema, o estudo aponta que as competências verdes ainda não estão consolidadas nas propostas curriculares das redes municipais, estaduais e federais de educação no Brasil. Para os jovens que desejam ingressar nesse mercado, será necessário buscar informações de forma independente. A literatura sobre sustentabilidade, os estudos acadêmicos e os cursos livres de capacitação são caminhos importantes para essa formação.
Com uma visão biológica, Carolina Tavares da Silva Bernardo, 43 anos, confirma que as instituições educacionais não estão preparadas para lidar com as mudanças e os desafios de trabalhar com sustentabilidade. Doutora em economia do meio ambiente, mestre em ecologia e bióloga, ela ratifica que os jovens devem usar a motivação e a curiosidade como base para entrar no mercado.
“O jovem deve ser curioso, perspicaz e ter vontade de continuar querendo aprender. A habilidade de ler artigos científicos é fundamental para que, assim, consiga relacionar a teoria com a prática. Então, os jovens nas áreas verdes, para se destacar, precisam fazer essa ponte entre o conhecimento prático e o teórico”, assegura.
Como ferramenta-chave para esse processo, Tavares garante que a geração atual tem um grande diferencial: o apoio da inteligência artificial. “Aprender a usar a inteligência artificial é um começo para se destacar. Utilizar como ferramenta nos processos de construção de conhecimento, de ponte e de inovação. Acho que isso é uma das características principais que os jovens precisam ter hoje”, conta.
Jovens na profissão
Mattheus Oliveira Silva, 27 anos, mora em Belém. Formado em gestão pública e relações internacionais, reflete que os empregos verdes vão muito além das categorias de trabalho convencionais. Para ele, é um ato político. Significa alinhar força de trabalho, energia e tempo com um propósito maior: o de garantir a vida no planeta. “Emprego verde é toda forma de trabalho que fortalece a comunidade e mantém a floresta em pé”, expressa.
Quando se fala sobre as habilidades impostas aos jovens na natureza, Oliveira afirma que, além dos conhecimentos técnicos de cada área, as qualificações mais importantes são as humanas e as políticas. A escuta ativa é imperiosa para ouvir e entender as reais demandas da comunidade. Já a comunicação eficaz é a destreza que passa os conhecimentos à frente. “Você precisa saber traduzir temas complexos, como ‘justiça climática’, para a linguagem da sua avó, do seu vizinho. Eu sinto que estou aprendendo essas habilidades no dia a dia do movimento social”, relata.
Atualmente, o belenense toca o Projeto Engajamento Coletivo em Oportunidades para Ação Climática (ECOA), que, por meio de uma seleção, reúne 28 organizações de juventude do Pará em uma jornada de fortalecimento em gestão e comunicação. Além disso, as organizações participantes recebem formação para desenvolver agentes de mudança na ação climática, apoiando a capacidade de organização, articulação e influência na política do clima em nível local, estadual, nacional e internacional.
Como conselho para os mais novos que desejam atuar nas causas ambientais, Sabrina e Mattheus deixam uma mensagem importante: “Meu conselho é explorar habilidades a partir de projetos voluntários, programas sociais e capacitações oferecidas por governos e ONGs. Desse modo, vamos poder fortalecer a cultura do impacto positivo e dar passos seguros rumo a um futuro mais sustentável”, declara Sabrina.
“Não deixem que te convençam de que seus sonhos profissionais são uma coisa e a luta pelo planeta é outra. Isso é uma mentira que contaram pra gente. Seus maiores talentos e suas maiores paixões podem e devem ser as armas que vocês usarão para defender nosso futuro. Comece a agir agora, no seu território, com as ferramentas que você tem. Ao fazer isso, você não estará apenas construindo uma carreira, você estará construindo um legado”, finaliza Mattheus.
Fonte: Correio Braziliense
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