Festival do Choro

Confesso que da primeira vez que vi O Curioso Caso de Benjamin Button não dei a devida atenção. Um tanto cansado, ainda mais para enfrentar duas horas e 45 minutos de filme, só saí do cinema pensando “é filme redondinho, bonitinho, feito pra ganhar Oscar mesmo”. Simplista por demais este meu raciocínio, por mais que outras pessoas também tenham comentado isso comigo. É até engraçado que David Fincher, o cineasta de Seven e Clube da Luta tenha feita algo tão arrumadinho, doce, suave. Mas essa sensação se desfez – pelo menos em parte – quando revi o filme, e notei que na segunda parte ele melhora. Quando o protagonista começa a rejuvenescer, o filme cresce, e os dilemas propostos, por mais que advindos de uma fábula extremamente impossível, e entramos pra dentro da lógica maluca que o relógio ao contrário impõe a Benjamin. O ritmo, as sub-histórias e até o personagem principal lembraram a mim um pouco de Forrest Gump. Mas na reta final, a produção acelera na emoção, e aí revivemos os encontros e desencontros da história, de Daisy muito jovem quando ele estava velho, depois ela idosa quando ele virava criança e perdia a memória de sua vida. De vazar os canais lacrimais. Ou será, que por ser pai vitaminadamente coruja as cenas da criança ouvindo histórias na cama, e depois desaprendendo a caminhar é que mexeram comigo? Continuo achando que a fórmula é feita pra ganhar Oscar, e não sei se merece, mas que chorei, chorei.

Mas o estoque de papel higiênico sofreu um baque neste fim-de-semana, até porque fui às lágrimas pelos mesmos motivos (família, criança, relacionamento) assistindo Foi Apenas um Sonho. Tal qual o filme com o Brad Pitt, este drama - muito mais denso e triste -, cresce na segunda metade, ficando a relação do casal intensamente grave, com atuações igualmente intensas de Leonardo DiCaprio (que confirma minha tese, o cara é bom quando é dirigido por um grande diretor) e Kate Winslet, igualmente soberba – embora ele, em seus ataques de fúria seja explosivamente surpreendente. Nem longe o casal April e Frank lembra o par romântico de Titanic. A única que coisa que liga ao blockbuster de 1997 é reunião dos dois atores. A atriz inglesa, que foi premiada duplamente no Globo de Ouro por este e pelo inédito O Leitor (ao qual ela está indicada ao Oscar), arrasa mesmo como uma dona de casa que transita entre a euforia e o desespero. O diretor talentoso por trás disso tudo é o marido de Kate, Sam Mendes, um cineasta que não brinca em serviço. Pelo argumento poderíamos assistir um romance cheio de altos e baixos e um final feliz lacrimoso, mas não. Mendes foi o premiado diretor de Beleza Americana, seu primeiro filme – e isso diz tudo. Sua predileção por temas comuns do cotidiano, especialmente a família, mas abordados de uma forma visceral, incomoda qualquer um e deixa pensando, entre soluções e fungadas. Mais do que a obra cultural, talvez essa seja a função primordial da sétima arte: fazer pensar. Revisar sua própria vida, seus valores, amar mais a quem você ama. Foi Apenas um Sonho, em cartaz nos cinemas, é um sacolejo no nosso corpo. Faz a mente pegar no tranco. E dê-lhe choro.

Comentários

Mauro disse…
Assisti ao "Curioso caso..." e achei um filme sem muitas surpresas além da boa transformação na maquiagem do Brad Pitt. O filme poderia ser menor e menos cansativo, cheguei a pensar em dar uma cochilada.
Que bom que voltou a escrever por aqui... tenta não parar como o Cena de Cinema parou!