Numa manhã ensolarada de Los Angeles, lá pelos idos de 2009 ou 2010, reúne-se um grupo de executivos de um estúdio de Hollywood:
Engravatado 1: "Que tal se refilmarmos algum filme de esporte dos anos 80? Primeiro pensei em A Cor do Dinheiro, mas daí lembrei que sinuca não é esporte. Ou é? Sei lá, muito complexo. O que vocês acham de uma nova versão de Rocky?"
Engravatado 2: "Mas o Stallone acabou de fazer Rocky Balboa e encheu os bolsos. Parece que fez botox até no saco com a grana que ganhou na participação na bilheteria... Acho muito cedo para um remake. Vamos esperar mais uns dois anos, daí já podemos escalar o Justin Bieber no papel do garanhão italiano. E de repente a gente encomenda pros pais da Dakota Fanning mais uma mini-adulta prá fazer o par romântico. Com três anos, elas já tem cara de velhas, mesmo."
Engravatado 3: "Verdade, mas acho interessante mantermos nosso foco pelo menos no boxe. Quem sabe podemos usar a mesma história do Falcão - O Campeão dos Campeões?, aquele filme meia-boca com o Stallone sobre um campeonato mundial de queda-de-braço (pausa para gargalhadas generalizadas) que fez um sucesso incrível no Brasil?"
Engravatado 1: "Bah, que ótima idéia. Nunca fizeram um filme focado em relações familiares ambientado no mundo do boxe.”
Engravatado 2: “Você quer dizer, fora O Campeão...”
Engravatado 1: “Ah, é. Fora esse.”
Engravatado 3: “E tirando também o próprio Rocky Balboa, né? E O Vencedor, com o Batman e o Marky Mark, que saiu ano passado...”
Engravatado 1: “Hmmmm, é, tirando esses todos aí. De repente, acho que dá prá diferenciar deles. Quem sabe a gente enfia uns robôs no meio prá faturar em cima do sucesso dos Transformers?"
Engravatado 1 e Engravatado 3, em coro: "Fechado! Quando começamos a rodar?"
O diálogo acima, se é que não ocorreu exatamente com essas palavras, com certeza se aproxima muito da reunião em que foi decidido o financiamento para Gigantes de Aço (Real Steel, EUA, 2011), em cartaz nos cinemas.
No filme, ambientado em um futuro bem próximo (2020), o boxe tradicional foi banido por não atender às expectativas sanguinárias do público (são citados até os Gracie num diálogo!) e substituído por lutas entre robôs, que podem alcançar níveis de brutalidade antes impossíveis quando o esporte era praticado por homens.
Um ex-boxeador falido (Hugh Jackman, que provavelmente tem a mesma cláusula em seus contratos que o Matthew McConaughey que lhe impõe ter pelo menos uma cena sem camisa, por mais estapafúrdia e fora de contexto, em todo e qualquer filme em que atue), para receber uma bolada de dólares que pode lhe servir de financiamento para a construção de um desses robôs, é obrigado a conviver durante um tempo com o filho de 11 anos com quem nunca teve qualquer relação. A dupla acaba encontrando um robô antigo em um ferro-velho e, daí para estarem competindo na Liga Mundial do Boxe de Robôs, é um pulinho que não dura mais do que meia-dúzia de cenas clipadas.
Desde o início pensado como uma diversão voltada para a família inteira (ao contrário de Transformers 2 e 3, que visavam principalmente a parcela de deficientes mentais do público de cinema), Gigantes de Aço, ao mesmo tempo em que é previsível até a medula (ou, no caso, até o hard drive), também é agradável como só um filme que não demorará muito para ser reprisado à exaustão na Sessão da Tarde pode ser.
Equilibrando com competência a parte chororô do roteiro (a manjada redenção do pai ausente e a inevitável reconciliação com o filho e seus erros do passado é um pé no saco e uma ótima oportunidade de ir ao banheiro ou dar uns amassos na amiga que entrou desavisada no cinema) com a porção voltada à adrenalina (os fantásticos embates entre os robôs, filmados com gosto pelo diretor Shawn Levy, o mesmo dos dois Uma Noite No Museu), Gigantes de Aço acaba por se revelar um daqueles passatempos tão divertidos e despretensiosos que até dá para perdoar os seus defeitos que já vêm de fábrica.
E muito contribui para isso a acertadíssima decisão de nunca dotar o robô controlado pelos protagonistas com personalidade humana (o que até é sugerido em dado momento, mas que se atém aos limites da própria imaginação do garoto interpretado por Dakota Goyo, o mesmo piá que fez a versão mirim do Thor há alguns meses atrás), preferindo investir nos personagens de carne e osso, coisa rara em tempos de filmes como Transformers 3 ou qualquer outro protagonizado por Adam Sandler ou Rob Schneider.
Gigantes de Aço consegue um salvo-conduto louvável em meio às inúmeras porcarias carregadas de efeitos visuais fabricadas pelo cinemão americano: é um filme que, ao contrário de seus personagens metálicos, tem lá alguma alma dentro de si. Uma alma piegas e derivativa, mas ainda assim uma alma. O que, graças aos deuses do cinema, só foi possível porque os engravatados lá do início não deram pitaco também na hora de sua execução.
P.S.: cada vez que a Evangeline Lilly (sim, a Kate aqueeeela) dá um sorriso luminoso na tela, um fã de Lost é capaz de enfartar. Eu consegui me segurar. Leve comprimidos sublingüais, por via das dúvidas.
Luiz Fernando Pedrazza (texto composto de vários pedaços catados no ferro-velho de um outro produzido para a Revista Rua Grande e reconstruído sem muita noção pelo próprio autor)
Engravatado 1: "Que tal se refilmarmos algum filme de esporte dos anos 80? Primeiro pensei em A Cor do Dinheiro, mas daí lembrei que sinuca não é esporte. Ou é? Sei lá, muito complexo. O que vocês acham de uma nova versão de Rocky?"
Engravatado 2: "Mas o Stallone acabou de fazer Rocky Balboa e encheu os bolsos. Parece que fez botox até no saco com a grana que ganhou na participação na bilheteria... Acho muito cedo para um remake. Vamos esperar mais uns dois anos, daí já podemos escalar o Justin Bieber no papel do garanhão italiano. E de repente a gente encomenda pros pais da Dakota Fanning mais uma mini-adulta prá fazer o par romântico. Com três anos, elas já tem cara de velhas, mesmo."
Engravatado 3: "Verdade, mas acho interessante mantermos nosso foco pelo menos no boxe. Quem sabe podemos usar a mesma história do Falcão - O Campeão dos Campeões?, aquele filme meia-boca com o Stallone sobre um campeonato mundial de queda-de-braço (pausa para gargalhadas generalizadas) que fez um sucesso incrível no Brasil?"
Engravatado 1: "Bah, que ótima idéia. Nunca fizeram um filme focado em relações familiares ambientado no mundo do boxe.”
Engravatado 2: “Você quer dizer, fora O Campeão...”
Engravatado 1: “Ah, é. Fora esse.”
Engravatado 3: “E tirando também o próprio Rocky Balboa, né? E O Vencedor, com o Batman e o Marky Mark, que saiu ano passado...”
Engravatado 1: “Hmmmm, é, tirando esses todos aí. De repente, acho que dá prá diferenciar deles. Quem sabe a gente enfia uns robôs no meio prá faturar em cima do sucesso dos Transformers?"
Engravatado 1 e Engravatado 3, em coro: "Fechado! Quando começamos a rodar?"
O diálogo acima, se é que não ocorreu exatamente com essas palavras, com certeza se aproxima muito da reunião em que foi decidido o financiamento para Gigantes de Aço (Real Steel, EUA, 2011), em cartaz nos cinemas.
No filme, ambientado em um futuro bem próximo (2020), o boxe tradicional foi banido por não atender às expectativas sanguinárias do público (são citados até os Gracie num diálogo!) e substituído por lutas entre robôs, que podem alcançar níveis de brutalidade antes impossíveis quando o esporte era praticado por homens.
Um ex-boxeador falido (Hugh Jackman, que provavelmente tem a mesma cláusula em seus contratos que o Matthew McConaughey que lhe impõe ter pelo menos uma cena sem camisa, por mais estapafúrdia e fora de contexto, em todo e qualquer filme em que atue), para receber uma bolada de dólares que pode lhe servir de financiamento para a construção de um desses robôs, é obrigado a conviver durante um tempo com o filho de 11 anos com quem nunca teve qualquer relação. A dupla acaba encontrando um robô antigo em um ferro-velho e, daí para estarem competindo na Liga Mundial do Boxe de Robôs, é um pulinho que não dura mais do que meia-dúzia de cenas clipadas.
Desde o início pensado como uma diversão voltada para a família inteira (ao contrário de Transformers 2 e 3, que visavam principalmente a parcela de deficientes mentais do público de cinema), Gigantes de Aço, ao mesmo tempo em que é previsível até a medula (ou, no caso, até o hard drive), também é agradável como só um filme que não demorará muito para ser reprisado à exaustão na Sessão da Tarde pode ser.
Equilibrando com competência a parte chororô do roteiro (a manjada redenção do pai ausente e a inevitável reconciliação com o filho e seus erros do passado é um pé no saco e uma ótima oportunidade de ir ao banheiro ou dar uns amassos na amiga que entrou desavisada no cinema) com a porção voltada à adrenalina (os fantásticos embates entre os robôs, filmados com gosto pelo diretor Shawn Levy, o mesmo dos dois Uma Noite No Museu), Gigantes de Aço acaba por se revelar um daqueles passatempos tão divertidos e despretensiosos que até dá para perdoar os seus defeitos que já vêm de fábrica.
E muito contribui para isso a acertadíssima decisão de nunca dotar o robô controlado pelos protagonistas com personalidade humana (o que até é sugerido em dado momento, mas que se atém aos limites da própria imaginação do garoto interpretado por Dakota Goyo, o mesmo piá que fez a versão mirim do Thor há alguns meses atrás), preferindo investir nos personagens de carne e osso, coisa rara em tempos de filmes como Transformers 3 ou qualquer outro protagonizado por Adam Sandler ou Rob Schneider.
Gigantes de Aço consegue um salvo-conduto louvável em meio às inúmeras porcarias carregadas de efeitos visuais fabricadas pelo cinemão americano: é um filme que, ao contrário de seus personagens metálicos, tem lá alguma alma dentro de si. Uma alma piegas e derivativa, mas ainda assim uma alma. O que, graças aos deuses do cinema, só foi possível porque os engravatados lá do início não deram pitaco também na hora de sua execução.
P.S.: cada vez que a Evangeline Lilly (sim, a Kate aqueeeela) dá um sorriso luminoso na tela, um fã de Lost é capaz de enfartar. Eu consegui me segurar. Leve comprimidos sublingüais, por via das dúvidas.
Luiz Fernando Pedrazza (texto composto de vários pedaços catados no ferro-velho de um outro produzido para a Revista Rua Grande e reconstruído sem muita noção pelo próprio autor)
Comentários