ARTIGO INÉDITO: "Economia em retomada?", de ELY JOSÉ DE MATTOS, economista e professor

Todos os sábados publicamos aqui artigos especiais dentro da campanha "A Sociedade e o Pós-Covid". Semanalmente divulgamos as ideias de gestores, autoridades, lideranças, especialistas e pensadores sobre a retomada da economia do RS e do Brasil. Este artigo inédito é  do Economista  e Professor da Escola de Negócios da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Ely José de Mattos


Economia em retomada?


Ainda estamos em pandemia. Apesar do avanço da vacinação e da consequente melhora dos números de mortes e contágios por coronavírus, não estamos em situação de normalidade no momento. Mas, sim, estamos nos recuperando aos poucos. Só que esta recuperação ainda é desequilibrada e, ao que me parece, pode ser um tanto frágil. Chamo a atenção para três elementos.

i) O emprego vem reagindo nos últimos meses, mas acompanhado de um aumento de ocupação com insuficiência de horas – ou seja, pessoas sendo contratadas por menos horas do que gostariam – e queda do rendimento médio. Claro que contratar mais é boa notícia no atual contexto. Mas a estrutura da contratação importa muito para falarmos em potencial retomada, que beneficie mais homogeneamente a população. O que estamos vendo hoje é um crescimento do emprego associado a um aumento da desigualdade.

ii) A dinâmica econômica, observada através dos indicadores de atividade, está reagindo de forma errática. Ainda há bastante desorganização na estrutura produtiva, com falta de insumos para vários setores e também com seus preços inflacionados. Ainda precisaremos de alguns meses desta nova “normalidade” para colocar a estrutura da economia em situação mais regular. E aqui o dólar também desempenha um papel central, encarecendo os insumos e, às vezes, jogando contra o abastecimento interno de produtos. 

iii) A inflação, de outro lado, vem para assustar o consumidor. Se, por um lado, as causas estruturais desta inflação (petróleo, dólar, alimentos, energia elétrica) indicam que ela pode ser corrigida ali na frente, quando estas questões se acomodarem, alguns elementos inerciais (a transmissão desta inflação para valores de rendimentos, como aluguel e outras rendas) nos fazem temer que ela possa ser mais duradoura. Isso significa que pode ser mais difícil controlar a inflação do que simplesmente aumentar juros e esperar que a crise hídrica se resolva, por exemplo. Aliás, aumentar juros, em um cenário de retomada, por si só já é um problema, pois penaliza o consumo, tão importante neste momento.

Então, temos este tripé complicado estabelecido. Emprego, produção e preços operam de maneira coordenada, de modo que não conseguiremos resolver a equação olhando para cada um deles isoladamente. Partindo de um economista, trata-se de um clichê: será preciso organizar a produção para produzir mais, empregando mais (e com mais qualidade) e, assim, gerando renda que virará consumo. Para isso, precisamos de um plano organizado de retomada.









Dr. Ely José de Mattos
é Economista e Professor da Escola de Negócios da PUCRS. Foto: Bruno Todeschini.

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