Ciência em ação: descoberta pode prever o risco de Alzheimer e uma nova terapia contra tuberculose

Cientistas apresentaram um novo método para identificar pessoas com maior risco genético de desenvolver a doença de Alzheimer antes que qualquer sintoma apareça. A pesquisa, publicada neste mês de setembro abre caminhos para acelerar a criação de novos tratamentos e aprimorar o rastreio e diagnósticos de pacientes.

Unsplash

O Alzheimer é uma doença neurodegenerativa caracterizada pelo comprometimento da memória e da capacidade de realizar tarefas cotidianas. O diagnóstico clínico geralmente ocorre tarde (quando o paciente já apresenta lapsos de memória), embora os mecanismos de ação da doença estejam presentes anos antes do aparecimento dos primeiros sintomas.

Os tratamentos disponíveis, por sua vez, ainda não têm bons resultados para reverter os prejuízos causados pelo Alzheimer. Cientistas em todo o mundo têm buscado respostas para acelerar o diagnóstico de Alzheimer e oferecer medicamentos capazes de paralisar o avanço da doença ou reduzir a velocidade de progressão.

Uma das frentes de atuação científica é a análise genética. Pesquisas anteriores já haviam identificado três genes que seriam responsáveis pelo desenvolvimento de uma forma rara de Alzheimer, de início precoce.

Os cientistas expandiram a varredura genética para criar uma pontuação poligênica para o Alzheimer – ou seja, uma estimativa, com base em variantes genéticas, de que a doença apareça.

A pesquisa foi realizada por cientistas ligados ao Broad Institute of MIT (Massachusetts Institute of Technology) e Universidade Harvard, nos Estados Unidos, e publicada na revista científica PLOS Genetics.

Os pesquisadores analisaram os dados de 7,1 milhões de alterações na sequência de DNA obtidos em um estudo anterior com milhares de pessoas com e sem Alzheimer. Eles usaram esses dados para desenvolver um novo método que prevê o risco de uma pessoa desenvolver Alzheimer dependendo de quais variantes de DNA ela possui. Depois, refinaram e validaram o método com dados de outras 300 mil pessoas.

Além disso, os cientistas analisaram a concentração de 3 mil proteínas no sangue de pessoas classificadas como de alto e de baixo risco na pontuação genética para o Alzheimer.

O objetivo era saber se a concentração de determinadas proteínas no sangue era maior ou menor dependendo do risco genético para Alzheimer. Essa análise revelou 28 proteínas que podem estar ligadas ao risco de Alzheimer, incluindo algumas que nunca foram estudadas.

A identificação de proteínas que podem estar associadas ao Alzheimer é importante porque essa informação pode oferecer pistas para o desenvolvimento de tratamentos eficazes. Descobrir biomarcadores da doença pode ser um caminho para desvendar os mecanismos biológicos do Alzheimer e, consequentemente, avançar em pesquisas com medicamentos.

Apesar do potencial das descobertas para pesquisas futuras, os pesquisadores recomendam cautela no uso dos dados. Eles ponderam que a pontuação poligênica foi determinada usando dados de um banco britânico – o método pode não ser preciso para populações não europeias.

Além disso, afirmam, as diretrizes atuais não recomendam a avaliação de risco genético para o Alzheimer de forma ampla (apenas o rastreio de genes ligados a formas raras). Em parte porque uma avaliação desse tipo pode ter implicações como aumento da ansiedade, sem que ainda seja possível oferecer opções de tratamento e prevenção aos pacientes.

Tuberculose

A tuberculose era a principal causa infecciosa de morte antes da chegada da Covid-19, responsável por 1,5 milhão de vítimas por ano. No entanto, cerca de 5% dos casos são resistentes aos medicamentos utilizados hoje, o que dificulta o tratamento. Uma nova terapia chamada BPaL – que combina os antibióticos bedaquilina, pretomanida e linezolida – chegou a ser aprovada em 2019 pela agência reguladora dos Estados Unidos, com mais de 90% de eficácia, mas a grande quantidade de efeitos colaterais era um entrave para o uso. Agora, pesquisadores encontraram uma solução para o problema.

Segundo uma série de estudos de 2020, o tratamento com o BPaL é ligado a uma alta taxa de queixas como dores nos nervos, depressão espinhal ou registros de diminuição na produção de células responsáveis ​​pela imunidade, consequências devido à presença da linezolida. Porém, um estudo recém-publicado na revista científica New England Journal of Medicine mostrou que a dose utilizada de linezolida pode ser cortada pela metade, reduzindo drasticamente os efeitos, mas sem mudanças significativas na eficácia da terapia.

Os resultados são de um ensaio com 181 pacientes com tuberculose resistente em países como Rússia, África do Sul e Geórgia, que concentram as maiores taxas da doença no mundo. A conclusão é que, enquanto 1.200 miligramas de linezolida (dose original) por seis meses foi 93% eficaz, uma dose de 600 miligramas no mesmo período manteve 91% de eficácia – sem grandes alterações.

No entanto, a dosagem pela metade levou o número de participantes com supressão da medula óssea decorrente do tratamento a reduzir de 22% para apenas 2%. Entre os que sofrem de neuropatia periférica (causando dor no nervo), a diminuição foi de 38% para 24%

“Este é o começo do fim da tuberculose resistente aos medicamentos. Quanto mais rápido você trata a tuberculose de uma pessoa, menos contagiosa ela é. É como a Covid em muitos aspectos”, afirma a principal autora do estudo, Francesca Conradie, da Universidade de Witwatersrand, na África do Sul.

A tuberculose é uma doença infecciosa transmissível causada pelo bacilo Mycobacterium Tuberculosis que afeta o pulmão causando quadros de falta de ar, tosse e fadiga. O tratamento padrão dura geralmente seis meses, e é efetivo contra a doença. O problema é que cada vez mais são registrados casos de tuberculose resistente, quando o microrganismo não responde aos antibióticos convencionais.

O novo tratamento com o BPaL foi um sinal de esperança para o médico ucraniano Volodimir, de 25 anos, que preferiu não revelar seu sobrenome. Com um quadro de tuberculose resistente, ele antes seguia uma estratégia quase duas vezes menos eficaz, que envolvia tomar mais comprimidos, causava diversos efeitos colaterais neurológicos e não havia conseguido solucionar o problema.

Com a nova medicação, os sintomas desapareceram. Além disso, o BPaL durou apenas seis meses, contra dois anos do tratamento anterior. No dia da última dose, um exame mostrou que não havia mais vestígios da bactéria resistente causadora da tuberculose.

“Agora, posso começar a viver de novo”, disse o médico, que pretende voltar ao trabalho na próxima semana depois de oito meses afastado.

OMS atualizará diretrizes

A duração mais curta é de fato um diferencial na nova terapia pois facilita a adesão dos pacientes. Antes, além de menos eficaz, a estratégia envolvia até 23 comprimidos por dia durante dois anos – chegando a um total de 14 mil unidades ao longo do tratamento. Já o BPaL consiste em apenas cinco comprimidos por dia em seis meses – um total de menos de 750 unidades.

Para Natalia Lytvynenko, que supervisionou o tratamento com o BPaL na Ucrânia, o número mais gerenciável de pílulas facilita também o acompanhamento médico com os pacientes, especialmente aqueles deslocados pela guerra.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) afirmou que atualizará as diretrizes para recomendar a nova terapia com 600 miligramas de linezolida para a maioria dos pacientes com tuberculose resistente. Dois especialistas na área, não envolvidos no estudo, concordaram que se trata de “grandes avanços” na área.

“É um dos avanços que definem a pesquisa científica da tuberculose neste século”, escreveu Guy Thwaites, da Universidade de Oxford, e Nguyen Viet Nhung, do Programa Nacional de Controle da Tuberculose do Vietnã, em um editorial publicado no New England Journal of Medicine.

Da redação da Rede #AtitudePositiva



Comentários