Professoras de escola de Gravataí criam álbum da Copa no qual figurinhas são os alunos

Trocar figurinhas — ou conquistá-las no bafo — para completar um álbum está entre os hobbys preferidos de crianças de diferentes gerações. É assim há décadas. Quando chega a  Copa do Mundo, então, o encarte com os rostos dos jogadores vira objeto de desejo de praticamente todas elas. Mas por vezes fica mesmo só no desejo, pois o valor para completar um álbum é inacessível à realidade de muitas famílias brasileiras. Foi pensando nisso que duas professoras da EMEF Jardim Florido, escola pública de Gravataí, criaram a própria versão do colecionável da Copa do Catar para presentear os alunos da segunda série. 

Emissora de TV gravando reportagem na escola/Reprodução Facebook 

Batizado de Craques da Turma 2022, o projeto foi idealizado por Andréia Hegenbart, 43 anos, e Carla Faller, 47. Atentas ao frisson que o item gerava entre os alunos, mas sensíveis também à situação financeira dos pais, as duas resolveram unir o útil ao agradável: criaram um item que ajuda no ensino dos conteúdos e, ao mesmo tempo, diverte e gera inclusão entre os pequenos. 

— Na minha turma, somente dois alunos tinham o álbum oficial da Copa do Mundo. Traziam para a aula, mostravam as figurinhas, e os outros ficavam só olhando. Alguns começaram a fabricar suas próprias figurinhas, desenhando os jogadores no caderno, para poder brincar e interagir com os outros colegas. Isso acabou nos tocando, pois, como que uns vão ter um álbum bem lindo e os outros vão ficar só olhando? Não que aquela figurinha feita por eles não tivesse valor, mas pensamos que seria legal se todos tivessem a oportunidade de ter um álbum igual — explica Andréia. 

As professoras buscaram inspiração para a confecção dos álbuns na internet. Fotografaram os alunos em sala de aula, editaram as imagens, aplicando detalhes como numeração e nome dos "jogadores", criaram o design das páginas onde seriam coladas as figurinhas e imprimiram todo o material. 

Trabalho extraclasse, feito por elas no final de semana, com recursos próprios. O ideal é que não fosse preciso ser desta forma, mas valeu a pena, garantem. Os alunos ficaram eufóricos ao receber os álbuns, tratados como verdadeiras relíquias por eles. 

— O cuidado deles com o álbum é muito bonito. Tem alunos meus que os pais mandaram plastificar. Vai ser uma recordação para a vida toda deles — pontua Carla. 

A alegria maior, porém, era quando recebiam suas figurinhas. Os itens foram sorteados três a três e, a cada aula, a ansiedade por ser o craque sorteado tomava conta dos estudantes, lembram as professoras. Eles não viam a hora de colar suas fotos e sair por aí mostrando para todo mundo. Tanto que, durante a visita da reportagem à escola, na quinta-feira (17), a maior disputa era por quem mostraria primeiro o seu rostinho no álbum. Os pequenos craques gostam do holofote. 

— Sou o último do álbum. Achei bem legal — disse Valentim Prattes, oito anos, apontando a foto. — Agora eu tô bem ansioso para a Copa. Tomara que o Brasil seja campeão — torceu. 

— Eu tô a mesma coisa que o Vavá, ansioso — contou Enzo Gabriel Moreira, sete anos, reivindicando participação na conversa. 

— O Brasil vai jogar a final contra a França — opinou Miguel Gasapini, oito anos, convicto de que a Seleção Brasileira vai desbancar a última campeã do torneio. 

— Eu acho que vai ser contra os Estados Unidos — discordou Enzo, fazendo a sala de aula virar uma versão mirim do Sala de Redação. 

— Mas o melhor jogador é o Pedro. Quando fiz dois gols no futebol, eu fiz a comemoração dele — finalizou Valentim, reproduzindo a dancinha do craque do Flamengo e contando que, se for no futsal, joga de atacante, mas no campo prefere a lateral esquerda. 

Os palpites passaram a ser frequentes após o início do projeto. O álbum fez com que os pequenos se interessassem pela Copa do Mundo, o que para as professoras é muito positivo. Descobriram algo capaz de prender a atenção dos estudantes em sala de aula — o que, dizem, tornou-se um desafio após o período de aulas online durante a pandemia — e, agora, podem usar o evento futebolístico como gancho para trabalhar os conteúdos previstos para a série. 

— Estamos elaborando outras atividades a partir das dúvidas que eles próprios vão trazendo. Por exemplo, eles conheceram o mascote desse ano e acabaram questionando se nos outros anos também tinha mascote. Sobre o país onde vai acontecer, ficaram curiosos para saber quais foram os outros. Isso nos permite trabalhar uma série de coisas: geografia, cultura dos países, escrita dos nomes, continhas com os resultados... — afirma Andréia. 

— A gente explica as coisas, fala sobre a história da Copa, e eles começam: "Prô, mas como é que tu sabe tanta coisa?". Isso desperta um desejo neles de adquirir conhecimento, de também saber de muitas coisas — completa Carla. 

Para as docentes, este é mais um exemplo de como o futebol vai além do esporte disputado em campo. E é também um exemplo de que é o trabalho dos professores que sustenta a educação pública, ainda que a classe siga precisando lutar por valorização. 

— Esse trabalho, entre tantos que a gente faz em sala de aula, foi o que teve uma repercussão. Mas ele é um entre muitos que fazemos com esse olhar para além do currículo. Professor está sempre em função dos alunos, com a cabeça girando em torno deles, pesquisando para trazer o melhor. A gente ama o que faz e sabe que isso é muito importante para despertar a vontade de estar na escola, não querer faltar na aula e estar na sala de aula com prazer — finaliza Andréia.

Leia a reportagem original em GZH

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