ARTIGO: Diversidade na escola: uma conversa que a gente precisa ter

Para começar essa conversa, é preciso entender que escola não flutua socialmente, nem é protegida das influências que a cercam por conta dos seus muros de concreto. Como apontam os Estudos Críticos do Discurso, a escola está ligada a uma rede de práticas sociais que se dão em vários lugares diferentes, nos quais discursos sobre a diversidade são produzidos, reproduzidos, questionados/mantidos e propagados.

Esse processo retroalimenta os discursos dentro da própria escola em suas práticas pedagógicas. Daí ela pode atuar de duas maneiras: questionando as representações estereotipadas dos corpos que estão ali presentes ou apagando as contradições que esses mesmos corpos provocam ao optar pelo discurso da neutralidade (que de neutro não tem nada, minha gente).

Imagem gerada por IA

Não é necessário um esforço hercúleo para que a diversidade seja observada nos bancos escolares, nos corredores por onde passam nossas/os estudantes ou nas vozes e corpos que se materializam no dia a dia das unidades escolares da nossa cidade. Mulheres, pessoas negras e indígenas, refugiadas/os, jovens LGBTQIAPN+, pessoas com deficiência ou pobres. Uma pluralidade que instiga questionamentos e reflexões pelo simples fato de serem e estarem na escola.

No entanto, nem mesmo tamanha obviedade é capaz de conter um movimento perigoso de que na escola não se pode discutir determinados assuntos por não serem “acadêmicos”. Infelizmente, esse movimento nega a existência de corpos que fogem a um único padrão estético, reforça a ideia de uma raça/etnia que se entende universal e perpetua o entendimento de que há apenas uma única possibilidade de amar e constituir-se em sociedade.

Nessa perspectiva, pensando nas relações étnico/raciais, não se fala ampla e produtivamente em racismo na escola. Ainda, mesmo embora seja óbvia a pluralidade de expressão do desejo, na escola não se pensa em outros arranjos que apontem para além da cisheteronormatividade.

Certamente, eu poderia ficar falando aqui por páginas sobre o que não é feito nas escolas, por omissão ou desconhecimento, mas acredito que a melhor estratégia para mudar esse cenário, e reconhecer que a diversidade só traz benefícios para a educação, seja pensar na potencialidade da formação continuada para as/os profissionais da educação e na legalidade que as normativas (federais e distritais) trazem para essa discussão.

Por meio da formação continuada é possível refletir sobre os documentos que orientam a educação no Brasil e no Distrito Federal em diálogo com as teorias e dados que nos provocam a pensar na diversidade, seja ela de gênero, sexual, étnico-racial, religiosa dentre outras tantas categorias. Na troca de experiências e saberes, bem como refletindo sobre os textos, que têm seus próprios poderes de mudança, é possível perceber que falar sobre gênero é questionar a divisão sexual do trabalho ou mesmo a ideia de que são somente as mulheres que cuidam.

Dessa maneira, apoiadas/os na Lei Maria da Penha, por exemplo, as/os profissionais podem promover rodas de conversa sobre os tipos de violência que afetam as mulheres, bem como sobre a relação de objetificação e posse naturalizada entre nós homens. É na formação continuada e na reflexão sobre as normativas que podemos propor uma discussão ampla e a promoção de atividades corriqueiras, e não pontuais próprias de uma pedagogia de eventos, sobre as relações étnico-raciais também.

A escola, pessoas queridas, pode ser tudo. Lugar de acolhida e empoderamento ou manutenção de opressão e exclusão. Eu escolho a escola da mudança e, por isso, acredito que uma formação continuada crítica e reflexiva, aliada à legalidade das normativas educacionais, pode repensar a diversidade e entendê-la com potência para prospectar novos mundos. Mundos melhores e possíveis. E você, que escola escolhe?

Artigo de Leonardo Café - Professor da educação básica na Secretaria de Educação do DF, mestre e doutorando em linguística na UnB e pesquisador de gênero, diversidade sexual e educação. Também autor de A gente só é, e pronto!, da Editora Appris

Confira post original do Correio Braziliense


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