Instituto Marinho do sul de Santa Catarina prepara crianças para serem guardiãs do oceano

O programa Monitoramento Mirim Costeiro nasceu de um sonho da oceanógrafa Caroline Schio. Ela estava se formando na faculdade quando começou a pensar de que forma poderia utilizar seu conhecimento para contribuir com a sociedade. 

Carol queria algo que fosse ligado ao dia a dia das pessoas e que pudesse ser aplicado de forma prática, então criou uma metodologia pioneira de pesquisa-cidadã para crianças em idade escolar de quarta e quinta série. 

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“Ela sempre teve essa preocupação de tentar passar adiante todo o saber a que teve acesso na universidade, porque acreditava que a ação de cada um poderia fazer a diferença”, conta Cris Guimarães, presidente do instituto que foi fundado em 2018 para aprimorar o programa (IMMC). 

O trabalho de cultura oceânica surgiu em Garopaba, município com cerca de 40 mil habitantes no litoral sul de Santa Catarina. Carol, junto com outros dois amigos locais, um geólogo e uma bióloga, implementaram o projeto piloto em 2012, em nove escolas municipais. Hoje, o programa alcança toda a rede municipal de Garopaba, com 12 escolas no total. 

“Nós monitoramos as sete praias de Garopaba. Cada escola monitora a praia mais próxima do seu bairro, justamente para a criança ir se empoderando sobre seu território, para entender a importância de cuidar daquele ambiente que ela desfruta”, aponta Cris.

A oceanógrafa Caroline Schio, junto com as crianças na praia/Divulgação

Tecnologia Social

Ao longo dos dez anos de atuação, cerca de 4.600 crianças se tornaram monitores mirins pelo programa, que foi certificado pela Fundação Banco do Brasil de Tecnologias Sociais, em 2017, e virou objeto de estudo na pesquisa de doutorado de Carol, na Universidade de Lisboa (ULisboa), em Portugal. 

Com a certificação, a metodologia passou a ser replicada com respaldo e segurança em outros municípios. Além de Garopaba, por exemplo, o programa foi implementado em Florianópolis (SC), Ubatuba (SP) e Portugal, transformando as crianças, portanto, em verdadeiras guardiãs ambientais.  

A formação das crianças em monitores mirins passa por um processo: primeiro, as crianças visitam uma exposição sobre o programa, com vídeos e amostras do acervo marinho. Lá elas têm acesso às ferramentas de pesquisa, observam as areias com mini-microscópio e olham os animais marinhos. É o primeiro contato com o programa.

“Depois, nos outros encontros, vamos com elas até a praia para fazer a pesquisa. Em sala de aula, os alunos calculam os indicadores que foram encontrados em cada praia. Por fim, são gerados os gráficos com o resultado da pesquisa”, explica Cris.

Os encontros variam de acordo com a quantidade de estudantes e de financiamento. Em Garopaba, onde o programa foi fundado, 22 turmas participam do projeto ao longo do ano, com uma média de quatro encontros por turma no total. 

O resultado fica exposto nas praias, que recebem uma placa com a foto da turma e os dados das pesquisas. Ao final, também é feito um encontro virtual para as crianças trocarem experiências, incluindo os participantes dos outros municípios brasileiros e do exterior onde o projeto está presente. 

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Pesquisa-cidadã

Para fazer a pesquisa, os alunos são divididos em grupos. Munidos de ferramentas, como peneiras, lupas, trenas, mini-microscópios e pás, os grupos ficam encarregados por um quadrado de pesquisa na praia, chamado de transecto. “Por isso é importante fazer com crianças do quarto e quinto ano, porque elas precisam saber matemática, calcular áreas”, lembra Cris. 

A pesquisa envolve a contagem de objetos naturais e também de resíduos, como bitucas de cigarro, tampinhas de garrafa e microplásticos. O que é natural, fica na praia. O resto é coletado e dispensado no lixo correto. Tudo é anotado em uma planilha, que será utilizada para elaborar os indicadores. 

“A área de pesquisa é pequena, mas depois, no final do ano, quando calculamos os indicadores, fazemos a extensão da praia com aquele resultado para ter uma ideia do que tem de resíduo e o que tem de objetos naturais”. 

Na praia, as crianças também observam a maré e aprendem a geografia do local: “elas  entendem por que há onda ou não ali, por que a areia é mais grossa ou mais fina, quais são as condições climáticas, se tem sol, se está nublado, os tipos de nuvens, enfim, fazem um estudo completo daquele ambiente”, explica Cris.

Guardiãs mirins do oceano

Cris Guimarães, presidente do IMMC, conta que a quantidade de microplástico encontrado nas praias vem aumentando vertiginosamente nos últimos anos. A pesquisa-ação, portanto, tem a função de despertar as crianças para a necessidade do cuidado com o meio ambiente, em especial, com as águas e os oceanos.

“Às vezes chegamos na praia e a areia está lisinha, então pensamos que está super limpa. Mas é só começar a mexer que vemos muitos microplásticos, porque o plástico não se decompõe, só vai se quebrando, e agora convivemos com o nano plástico, presente no sal marinho, no pescado, e já foi identificado inclusive no sangue humano, na placenta, e recentemente até no coração e no pulmão”, alerta.

Ela observa que o microplástico encontrado na praia é resultado do descarte inadequado de produtos em locais muito distantes dali: “cada embalagem que foi largada no meio-fio de uma cidade do interior e que entrou na tubulação vai parar nos rios e acabar no oceano. O que vemos na praia é resultado disso”. 

As crianças com a jornalista Cris Guimarães, atual Presidente do Instituto Monitoramento Mirim Costeiro. Imagem: reprodução.

Crianças conscientes, pais alertas

Segundo a presidente do IMMC, bituca de cigarro, plástico e microplástico são os resíduos mais encontrados nas praias pelos integrantes do programa. Ela atenta para o impacto desses materiais:

“Temos amostras estomacais de tartarugas e aves marinhas que comprovam que esses animais estão ingerindo plástico. E o plástico que está no oceano não é de agora, é de anos atrás. Pesquisas mostram que há pedaços de plástico dos anos 1970. Isso é muito preocupante! A ONU diz que até 2050, se não for feito nada, haverá mais plástico do que peixe no oceano…”

Desta forma, ela defende a importância de pensar globalmente e agir localmente: “Formamos quase cinco mil monitores mirins desde 2012. Ao ter contato com esse tema, as crianças se deram conta da importância de conservar o ambiente. E elas têm um poder de influenciar os pais que é incrível”, diz Cris.

Instituto Monitoramento Mirim Costeiro

Para implementar seus projetos, o IMMC conta com apoiadores locais, convênios e editais. Atualmente, o IMMC, além do programa de formação de monitores mirins costeiros, também realiza ações de limpezas nas praias em datas comemorativas e outras atividades de educação socioambiental, como oficinas eco educativas e expedições científicas.

A novidade mais recente é o uso de drones na pesquisa-ação, atraindo ainda mais a atenção de crianças e jovens para o tema. O Instituto está aberto a quem quiser replicar a metodologia do programa MMC. 

Para implementar o programa é preciso estabelecer parcerias com escolas públicas ou privadas e levantar um financiamento com empresas ou poder público para manter a estrutura da pesquisa-ação. Os técnicos ou professores que vão conduzir a pesquisa-ação também precisam passar por uma capacitação do IMMC, que pode ser feita de maneira presencial ou virtual. 

A Van do IMMC funciona como sede itinerante do programa em Ubatuba/Reprodução.

Quer apoiar essa causa?

O IMMC recebe doações e mobiliza trabalho voluntário em ações como o Dia Mundial do Oceano,  Dia Mundial de Limpeza de Rios e Praias e outras ações de Praia Limpa. 

Para saber mais informações sobre o IMMC, visite o site www.monitoramentomirimcosteiro.com.br

Fonte: Lupa do Bem








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