Brasil cria normas para evitar abusos de crianças em desastres climáticos

Os casos de assédio e abuso sexual registrados em abrigos temporários durante as enchentes históricas de 2024 no Rio Grande do Sul evidenciaram uma demanda que tende a crescer no contexto da crise do clima: a necessidade de estabelecer protocolos para proteger crianças e adolescentes em situações de desastres climáticos.

A poucas semanas da COP30, o Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) lançou um documento que busca preencher essa lacuna.

Veja nesta reportagem especial publicada na Folha de São Paulo.


Heloisa Melillo, coordenadora da Casa Violeta - Giovanni Disegna/Ascom SJCDH


A resolução Nº 273, publicada no Diário Oficial no último dia 14, estabelece parâmetros para a atuação de Conselhos Tutelares, órgãos públicos, escolas, Poder Judiciário e outros componentes do sistema de garantia de direitos diante dos impactos da mudança do clima.

Entre as medidas previstas, está o fortalecimento dos mecanismos de denúncia, proteção e responsabilização em casos de violações de direitos cometidas durante ou após o período de calamidade, incluindo a violência sexual e a negligência em alojamentos temporários.

O documento também determina a implantação de programas de incentivo à permanência escolar para crianças e adolescentes em deslocamento climático, "garantindo que, durante e após o desastre, as instituições de ensino desempenhem papel ampliado de acolhimento, proteção e apoio psicossocial".

No ano passado, o Conanda já havia divulgado recomendações para a proteção desse público em situação de riscos e desastres climáticos. O documento, apesar de não ter força de ato normativo como a nova resolução, detalha quais são as medidas recomendadas para a proteção em abrigos provisórios.

Entre elas, a distribuição dos espaços internos considerando a minimização dos riscos de violência sexual, a instalação de áreas específicas para crianças e adolescentes desacompanhados dormirem, separados por faixas etárias.

É recomendado também a criação de canais de denúncia para suspeitas de violência e a orientação a crianças e adolescentes sobre "o que é apropriado ou inapropriado em termos de toque e comportamento, encorajando-os/as a comunicar imediatamente qualquer situação desconfortável ou suspeita a uma pessoa adulta de confiança ou referência".

Em maio de 2025, o Instituto Alana lançou o guia "Cuidar e proteger: infâncias e adolescências em tempos de crise climática", baseado nessas recomendações.

Segundo Ana Claudia Cifali, coordenadora jurídica do Alana e integrante do Conanda, o material sistematizou os aprendizados e as experiências vividas no calor da emergência no Rio Grande do Sul e traz insumos para as gestões municipais e estaduais lidarem com os próximos eventos extremos.

"Eram muitas as questões que iam aparecendo. Por exemplo: crianças resgatadas desacompanhadas. Para onde levá-las? E como você vai entregar uma criança para alguém que diz que é da família, mas perdeu os documentos?", exemplifica Cifali.

"É preciso garantir uma reunificação familiar segura, até porque, segundo experiências internacionais, o tráfico de pessoas cresce nos momentos de emergência climática."

Ela menciona também os relatos de violência sexual nos abrigos —tanto aqueles cometidos por desconhecidos quanto abusos que já aconteciam na casa da família e passaram a ser praticados também durante o abrigamento— e lembra que houve discussões sobre casais adultos que praticavam atos sexuais dentro dos alojamentos coletivos.

"A partir disso, o guia traz recomendações para que as pessoas que forem trabalhar nos abrigos estejam atentas aos sinais e saibam encaminhar os casos."

Cifali destaca o papel das escolas na proteção e questiona o fato de serem vistas como a primeira opção de abrigo em caso de desastres.

"É tão importante manter um resquício de normalidade para essas crianças, é um serviço tão prioritário. Mas é o primeiro a ser interrompido para ser utilizado como abrigo, sendo que diversos outros locais podem ser usados: faculdades, centros esportivos, teatros."

Outra medida direcionada a proteger crianças e adolescentes em situações de eventos extremos climáticos, anunciada em agosto deste ano, é a revisão do Protocolo Nacional Conjunto para Proteção Integral a Crianças e Adolescentes, Pessoas Idosas e Pessoas com Deficiência em Situação de Riscos e Desastres.

Segundo o governo federal, o documento, que é de 2012, será atualizado à luz dos desafios impostos pelas mudanças climáticas. Em agosto, foi feita uma reunião técnica sobre o tema e estavam previstos encontros e oficinas de trabalho, envolvendo a sociedade civil, para estruturar a revisão.

Vigília noturna

Coordenadora da Casa Violeta, criada durante as enchentes em Porto Alegre para acolher exclusivamente mulheres e crianças, a pedagoga Heloísa Melillo (foto acima) conta os relatos que ouviu sobre a situação nos abrigos mistos:

"As mulheres se revezavam para fazer vigília durante a noite. Elas diziam que não podiam deixar as filhas irem sozinhas ao banheiro, porque poderiam ser agarradas no trajeto ou na saída", recorda-se. "As adolescentes eram frequentemente assediadas e houve pedidos de transferência imediata em alguns casos, porque já havia pessoas querendo avançar nas crianças."

A Casa Violeta funcionou por um ano e abrigou 78 mulheres e 57 crianças. No momento do fechamento, parte delas já havia retornado para suas residências ou para a casa de parentes, outra parte foi contemplada com programas sociais de moradia e aquelas que tinham problemas graves de saúde física e mental foram encaminhadas para espaços permanentes de acolhimento.

Para Melillo, tragédias exacerbam problemas que já existem dentro das relações humanas e "despertam o melhor e o pior das pessoas". "E, como os freios e contrapesos diminuem nas situações de emergência, as meninas e mulheres ficam ainda mais expostas a violências", diz.

Fonte: Folha de SP, acesse a reportagem completa e veja mais imagens


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