Esquecido ao longo de décadas depois de ser encontrado em uma mina de fosfato na Síria, no Oriente Médio, um fragmento de osso fossilizado de um pterossauro ganhou repercussão mundial ao ser analisado por um grupo internacional de pesquisadores que inclui um paleontólogo da Universidade Federal do Pampa (Unipampa).
| Caetano Soares/Divulgação |
O estudo recém-divulgado revela que o animal está entre os maiores espécimes voadores que já existiram, com tamanho estimado equivalente ao de uma aeronave de pequeno porte. A descoberta traz ainda novas informações sobre como e onde viviam esses gigantes da pré-história.
Publicada na revista The Science of Nature na semana passada, a pesquisa descreve o fragmento de um úmero (osso do braço) de um pterossauro — grupo de répteis alados que viveu até cerca de 70 milhões de anos atrás, período próximo ao da extinção de seus parentes, os dinossauros. Foram os primeiros vertebrados a desenvolver o voo ativo, sustentados por uma membrana esticada entre o corpo e um osso alongado da "mão".
Embora um fragmento isolado não permita a classificação de uma nova espécie, os cientistas acreditam que o úmero possa pertencer a um animal ainda desconhecido por razões como uma pequena variação anatômica, o local e a época em que teria vivido.
É possível afirmar com segurança que fazia parte da família dos azhdarquídeos, que reúne os maiores animais voadores já registrados. Eram desdentados, de pescoço longo e bico afiado, com o qual caçavam pequenas presas.
O fóssil foi descoberto há pouco mais de duas décadas em uma cadeia montanhosa próxima da cidade histórica de Palmira, mas ganhou pouca atenção até ser recentemente redescoberto e apresentado à comunidade científica. Inicialmente, acreditou-se que poderia ser parte da perna de um dinossauro, ou de um réptil aquático.
A pesquisadora sírio-brasileira Wafa Adel Alhalabi, que lidera o estudo vinculada à Universidade de São Paulo (USP), precisou usar recursos próprios para viajar até a cidade de Latakia e dar início à análise e reconstituição do fragmento de osso com cerca de 29 centímetros de comprimento. Seguiu a investigação em casa, em Damasco, usando ferramentas próprias em razão das dificuldades para desenvolver pesquisas científicas em solo sírio — por conta dos conflitos e das instabilidades políticas comuns na região.
Com a participação do pesquisador da Unipampa Felipe Pinheiro, especialista em répteis alados nascido no Ceará e radicado em São Gabriel, no sul do Estado, além de colegas brasileiros, sírios, libaneses, espanhóis e franceses, o trabalho estimou que esse espécime deve ter alcançado cerca de 10 metros de envergadura.
Isso o coloca entre os maiores animais voadores já documentados, com uma dimensão próxima à da maior espécie já vista até hoje, a Quetzalcoatlus northropi. Um pterossauro desse tipo, que chegava a 11 metros, foi encontrado no Texas (EUA).
— É, de fato, do tamanho de um pequeno avião, ou até um pouco maior do que um monomotor, por exemplo. Claro, temos um material isolado apenas, mas daria para dizer que é o segundo maior (animal voador) já descoberto. É um bicho muito grande — afirma Pinheiro.
A descoberta é relevante porque, além de registrar um dos maiores animais a cruzar os céus em toda a história, foi o primeiro fóssil de pterossauro localizado no territórios sírio. Isso indica que sua distribuição geográfica era mais ampla do que havia sido comprovado até então e reforça o potencial paleontológico, ainda pouco explorado, do Oriente Médio.
Como foi encontrado em depósitos de fosfato de origem marinha, algo raro para pterossauros, que costumam ser identificados em pontos mais para o interior de ambientes continentais, como em rochas de leitos de rios, o achado reforça ainda a hipótese de que esses gigantes alados também habitavam zonas costeiras.
— Um dos pontos mais significativos é que a gente começa a colocar em contexto os registros fósseis dessa região do Oriente Médio. Por conta da extrema instabilidade política, a Síria acabou ficando em uma espécie de buraco negro científico. É quase impossível fazer trabalhos de campo lá, mas é uma região com um potencial gigantesco para novos achados — complementa o professor da Unipampa.
Pinheiro, 38 anos, fez graduação em biologia no Ceará e começou a se interessar pelos pterossauros pelo fato de o Nordeste concentrar um bom número de fósseis desse tipo. Mudou-se para o Sul a fim de cursar mestrado e doutorado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e, há 11 anos, leciona na Unipampa.
A parceria global entre os cientistas deve continuar rendendo frutos. Outros fósseis de animais que viveram no fim da era dos dinossauros já foram encontrados e estão em estudo. As futuras pesquisas prometem revelar outros aspectos inéditos da pré-história de uma região — até agora — pouco explorada pela ciência.
Fonte: GZH
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