Se alguns porto-alegrenses ainda possuem dúvidas a respeito do feriado do Dia da Consciência Negra, as atividades culturais espalhadas pela Capital têm sublinhado, ao longo desta quinta-feira (20), a força de uma data que homenageia a morte de Zumbi dos Palmares, em 1695, e reafirma a presença histórica da população preta no Rio Grande do Sul. O tempo colaborou: céu claro, temperatura agradável e ruas movimentadas marcam um dia em que a cidade respira cultura, memória e ocupação.
| Leo Zanini/Museu do Hip Hop RS/Divulgação |
Uma das programações de maior robustez e destaque vem do Museu da Cultura Hip Hop RS, que realiza a segunda edição do Encontro Black. O fundador do espaço, Rafa Rafuagi, destaca que o evento “virou tradição para marcar não só o feriado, mas para democratizar o acesso do público a artistas que normalmente só poderiam ser vistos em shows pagos”.
A edição deste ano leva ao palco Thaíde, DNAMC’s, GilSoul, Grupo Jara e uma série de artistas locais selecionados pelo programa Vem Pro Museu, reunindo dança, rap, DJs e grafitagem ao vivo. As apresentações iniciam às 14h e seguem até as 20h.
“O museu é um espaço que defende essa história e promove uma relação de igualdade racial. Por isso, o Encontro Black é importante: ele coloca gerações diferentes juntas no mesmo espaço para celebrar e refletir sobre essa data”, resumiu Rafuagi. Antes mesmo do início oficial, mais de 2,5 mil ingressos haviam sido retirados — todos gratuitos, mediante a doação de um quilo de alimento.
Se a Zona Norte foi embalada pelo Museu do Hip Hop, na Zona Sul quem tomou as rédeas foi o Festival Zumbi Solidário, organizado pela Frente Negra Gaúcha (FNG) e realizado na quadra da Banda Saldanha, no bairro Praia de Belas. Com atrações que vão de samba ao reggae, passando por nomes consagrados como a Banda Black Rio com participação de Carlos Dafé, o festival ocupa o espaço do meio-dia até a meia-noite.
A presidente da FNG, Vanessa Mullet, explica que o evento nasce de uma necessidade concreta: dar visibilidade a artistas negros gaúchos. “No ano passado, quando houve um programa de TV sobre as enchentes, nenhum artista negro do Estado apareceu. A gente sentiu que precisava reagir”, contou.
A partir dessa lacuna, surgiu o festival, que chega à primeira edição formal com apoio institucional e previsão de reunir cerca de duas mil pessoas ao longo do dia. No local, além dos shows, há feira de afroempreendedores, exposição de escritores independentes e atividades culturais diversas.
“A ideia é ser um dia de acolhimento, de celebração, mas também de resistência. Hoje é sobre visibilidade, sobre mostrar as coisas bonitas que a gente faz e fortalecer a comunidade”, diz Vanessa.
No Largo Zumbi dos Palmares, na Cidade Baixa, a programação organizada pela prefeitura de Porto Alegre reforçou a tônica do protagonismo. Às 9h, o seminário Saúde da População Quilombola abriu o dia com debates promovidos pelo Quilombo do Mocambo. Logo depois, começaram as atrações musicais, desfile de moda afrocentrado, feira de alimentação e de afroempreendedorismo. À tarde, tem mais apresentações e destaque para a Marcha do Hip Hop, que percorre o Centro antes de chegar ao palco principal.
Karen Silva, coordenadora de Direitos e Promoção da Igualdade Racial da Secretaria Municipal da Inclusão e Desenvolvimento Humano (SMIDH), explica que o tema deste ano - Mulheres Negras: força ancestral, protagonismo presente - guiou toda a curadoria. “A ideia foi dar visibilidade a nós enquanto mulheres negras, que muitas vezes somos invisibilizadas. Das que estão na mídia às que estão nas periferias, liderando suas comunidades. A violência estrutural é pesada, e essa programação busca fortalecer quem, mesmo sem reconhecimento, move famílias e bairros inteiros”, afirma.
Ainda, para aqueles que não gostam de ficar parado, a celebração também encontrou morada na atividade física. Logo cedo, o Coletivo Corre Preto, em parceria com a Olympikus, realizou o Rotas da Consciência — corrida e caminhada que reuniu cerca de quatro mil pessoas pelas ruas da Capital. Houve percursos de 6 km, 3,5 km e uma caminhada de 1 km voltada a idosos, gestantes e mães com crianças. As rotas incluíram pontos simbólicos como o Mercado Público, a Praça da Alfândega, a Praça do Tambor e o Largo Zumbi.
Para Vitor Hugo Silva de Oliveira, um dos coordenadores do Coletivo, o evento marcou um ponto de virada. “Foi a primeira vez que as ruas da cidade ficaram fechadas para nós. Ver tantas pessoas pretas correndo, famílias inteiras, crianças e idosos… foi histórico. Um marco para a história do coletivo e para a população negra de Porto Alegre, que pôde se enxergar de uma perspectiva diferente”, finaliza.
Fonte: Jornal do Comércio
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